sábado, 4 de setembro de 2010

metades que se completam...

“A cidade de Sofrônia é composta de duas meias cidades. Na primeira, encontra-se a grande montanha-russa de ladeiras vertiginosas, o carrossel de raios formados por correntes, a roda-gigante com cabinas giratórias, o globo da morte com motociclistas de cabeça para baixo, a cúpula do circo com os trapézios amarrados no meio. A segunda meia cidade é de pedra e mármore e cimento, com o banco, as fábricas, os palácios, o matadouro, a escola e todo o resto. Uma das meias cidades é fixa, a outra é provisória e, quando termina a sua temporada, é desparafusada, desmontada e levada embora, transferida para os terrenos baldios de outra meia cidade.
Assim, todos os anos chega o dia em que os pedreiros destacam os frontões de mármore, desmoronam os muros de pedra, os pilares de cimento, desmontam o ministério, o monumento, as docas, a refinaria de petróleo, o hospital, carregam os guinchos para seguir de praça em praça o itinerário de todos os anos. Permanece a meia Sofrônia dos tiro-ao-alvo e dos carrosséis, com o grito suspenso do trenzinho da montanha-russa de ponta-cabeça, e começa-se a contar quantos meses, quantos dias se deverão esperar até que a caravana retome e a vida recomece.”

Por: Italo Calvino em "As Cidades Invisíveis"